domingo, 27 de abril de 2014

Vida Virtual X Vida Virtuosa



Excluindo-se os sociólogos, antropólogos e filósofos, poucos param para pensar na dimensão de poder que tem a Vida Virtual – os AVATARES, como chamarei o personagem que criamos dentro de uma rede social. E, sendo a mais difundida na atualidade no Brasil, refiro-me ao “FACEBOOK”.

Um belo dia em meio a uma crise de loucura, eu resolvi cometer suicídio virtual. E foi assim, sem nenhuma preparação para tal, sem nenhuma carta de prego ou de despedida que me EXCLUÍ da Rede Social!

Acredito que dá para fazer uma alusão com sair da Matrix, Acordar!

A partir daí, comecei a fazer as constatações que se seguem:

- Se em seu trabalho você necessita relacionar-se com o público, sua vida profissional fica no mínimo prejudicada, isto para não dizer que é impossível existir sem. De um dia para outro me vi sem contato algum com colegas de trabalho, alunos, prestadores de serviços, pessoas com quem eu preciso contatar direto, seja para vender ou comprar trabalho, para divulgar ou difundir ideia. Eu não tinha telefone, endereço, e-mail, nada de ninguém e nem eles tinham o meu, somente Facebook. A tal ponto que em casos extremos foi necessário pedir para amigos que, com seus avatares, eles deixassem recado para algumas destas pessoas, repassando meu número de contato e pedindo o deles.

- Depois fui percebendo o TAMANHO do buraco criado por esta contemporaneidade tecnológica na sociedade. É como outra dimensão em que 80% das pessoas estão inseridas. Um dia sentei e fiquei observando minha mãe (de 69 anos), sentada por horas em frente ao computador, praticamente imóvel, assistindo a vida dos outros e apercebendo-se muito pouco do que se passava em sua volta na vida real. Em dado momento ela até ficava irritada quando por algum motivo era obrigada a desviar sua atenção para o lado de cá.

- Comecei a me dar conta do quanto sabemos sobre a vida de pessoas que estão tão distantes, que nunca vemos, e quão pouco do que se passa com nosso vizinho. Constatei que no mundo virtual as pessoas gritam suas dores a pessoas que estão tão longe que não podem nem escutá-las, quanto mais lhes estender a mão.

- Quando me suicidei, acreditava que a partir dali eu estaria renascendo pra uma nova vida em que teria pessoas reais ao meu lado, para conviver, para trocar. Mas fui sentindo que mesmo quando as pessoas não estão dentro da dimensão virtual, esta ainda afeta sua dimensão real, pois os assuntos continuavam girando em torno da foto, do acontecimento, da vida que estas pessoas tão distantes postavam no Face, e em pouquíssimos momentos o assunto era o que nós vamos fazer agora, hoje a noite, amanhã... E eu passei a me sentir ainda mais só, pois os comentários sobre a vida dos outros neste momento não me interessavam, então eu entrava pro meu quarto e fechava a porta, e agora já não possuía mais nem a janela da tecnologia. Restava-me deitar e ler minhas paredes, onde estavam gravados meus pensamentos.

- Eles estavam literalmente gravados lá, porque outra mudança provocada na minha vida no tempo post-mortem foi o uso da criatividade. Principalmente nos primeiros dias. A adaptação foi barra, abstinência total, andava pela casa sem saber o que fazer, deitava, levantava, lia um pouco, comia, corria pelos canais de TV. Tentava de tudo, mas ainda faltava algo e aí caiu a ficha: Durante todo o tempo que eu passei na frente daquela tela, atualizando Feeds, assistindo a vida alheia, meu cérebro estava estagnado numa espécie de transe. Ele não precisava fazer força para montar ideias, pois elas já vinham prontas e de quebra em lindas e coloridas imagens por muitas vezes com acompanhamento sonoro, tudo aquilo agradava muito a minha mente e colocava dentro dela muito do que a Matrix queria, o ponto de vista e a opinião da Matrix. Aí eu me dei conta que estava LIVRE agora! Que eu tinha o direito de pensar, inventar, errar, acertar, soltar a “IMAGINAÇÃO”... Há quanto tempo eu não fazia isto?! Nós crescemos e vamos perdendo a propriedade criativa, vamos adequando-nos aos padrões impostos, e com a Matrix então, isto se tornou muito mais fácil. Depois desta conclusão eu pintei cartazes (ficaram bem ruins é verdade, já que eu não desenhava e nem pintava desde a 2° série), mas aquela sensação foi como correr descalça na praia num lindo dia de verão. Eu comprei giz branco e comecei a escrever as frases que gosto nas paredes escuras do meu quarto, de acordo com o ânimo e acontecimento do dia. Eu fiz o esboço de uma pequena comédia; eu fui passear com minha mãe; eu recuperei parte do meu tempo e da minha capacidade de julgamento perante a vida.

Necessitei, devido ao meu trabalho, criar uma nova conta no Facebook, mas desta vez ela é apenas uma conta, não é mais um avatar, pois fora a parte comercial, não tem nada de pessoal, eu entro rapidamente, vejo o que tem de mensagens profissionais, posto divulgação de trabalho, faço os contatos necessários e saio. E nem sinto a mínima vontade de permanecer por ali, como expectadora da vida alheia.

Acredito ainda não ser o fim das lições, mas é o que temos até o presente momento.

Líria Freitas
Acadêmica do curso de Bacharelado em Educação Física
ULBRA Gravataí

2 comentários:

  1. Olha ai Lu! O pessoal mostrando todo seu talento!
    Parece que deixamos um legado da escrita acadêmica!
    Parabéns a colega!

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  2. Você aprendeu a usar a matrix em seu favor, mesmo necessitando voltar a um tecnologia tão antiga qto escrever nas paredes... seria esta técnica o face de antigamente, usou até mesmo a tecnologia a pouco condenada por uma geração anterior a nossa, a tal caixa luminosa chamada TV, um recurso para sua abstinência de FB(apenas um rede dentro da rede). Parabéns por superar esta fase e usar a ferramenta q entorpece muitos como degrau para tua escala! Digamos q alguém conceituou isto como evolução! Abração!

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