Curso ensina equilíbrio, concentração e expressão corporal às crianças. Escolas regulares adotam curso circense no contraturno da grade regular.
Com 15 tatames e algumas bolas,
pratos de plástico e malabares, o professor Pedro Cauê Marques Levy, de
23 anos, transforma a área de recreio do Colégio Itatiaia, em São Paulo,
em um picadeiro. As aulas de circo na escola, realizadas uma vez por
semana durante 50 minutos, começaram em 2011 e, dois anos depois, o
grupo já dobrou de tamanho. Oferecida como opção de atividade
extracurricular em colégios particulares, as aulas circenses vêm
ganhando espaço por engajarem crianças e adolescentes em exercícios
físicos de forma lúdica e estimularem a concentração, a disciplina, a
expressão corporal e o trabalho em equipe, incluindo a confiança em si
mesmos e nos colegas.
Segundo Tamira Vital Nogueira,
assistente de coordenação da Unidade Paraíso-Paulista do Colégio
Itatiaia, a escola sempre busca atividades extracurriculares
diferenciadas para oferecer aos alunos, mas é o interesse das crianças
que faz com que as novidades se transformem em tradição.
Atualmente, 20 alunos de cinco a 11
anos participa das aulas, pelas quais seus pais pagam R$ 65 à parte da
mensalidade. Mesmo depois de um dia inteiro de aulas, os pequenos têm
energia de sobra para saltitar sobre o tatame em linha reta e de costas,
engatinhar de barriga para cima com o apoio apenas dos pés e das mãos,
deitar sobre a nuca com as pernas para cima, jogar malabares para o alto
e equilibrar pratos giratórios sobre um palito. Tudo sob o comando de
dois professores –um segundo foi contratado para dar conta da demanda em
alta.
Na quinta-feira (14), Lucca Augusto Neto
completou 7 anos e, além da festa com os pais e colegas no Itatiaia,
onde cursa o segundo ano do fundamental, ele ganhou a regalia de voltar
mais cedo para casa. Mas, segundo a mãe, o garoto pediu para voltar ao
colégio, pouco depois. “A gente estava fazendo a lição de casa e ele
falou ‘mãe, tem a aula de circo’”, contou a administradora Vivian
Carneiro Neto.
Lucca começou as aulas de circo em 2011,
quando se matriculou no colégio. “Acho que ele nunca se identificou tão
bem na vida”, afirmou a mãe.
O gerente de informática Daniel Antonio
Augusto Neto, pai do garoto, conta que se surpreendeu no início deste
ano com o aumento de crianças matriculadas no curso. “Muitos ficavam só
olhando e queriam brincar. Para eles, no final é uma brincadeira”,
disse.
Vivian explica que observou, durante o
último ano, o desenvolvimento das habilidades do filho. A corda de
tecido, por exemplo, sempre desafiou Lucca, que não tinha a força nos
braços exigida. Mas, durante a apresentação de fim de ano preparada para
os pais, o garoto conseguiu completar a acrobacia e a apresentou como
surpresa para a mãe.
O pai não pensa na possibilidade de
Lucca se machucar durante as aulas de circo. Para ele, como as crianças
não praticam a corda de uma altura muito alta, as chances de se
machucarem não é maior que em outras aulas da escola. “É a mesma chance
de levar uma bolada”, explica Augusto Neto.
Criatividade e auto-conhecimento
O Colégio Pueri Domus acrescentou as
aulas de circo em 2010 em uma lista que inclui rúgbi, esgrima, coral e
capoeira, entre outras atividades de suas quatro unidades na Grande São
Paulo. O objetivo, segundo a escola, é “despertar nos alunos a
criatividade, a coletividade, a concentração e o auto-conhecimento,
envolvendo o aspecto cultural, educacional e esportivo”.
Atualmente, a escola afirma ter 30
alunos matriculados nas aulas de acrobacias, corda bamba, malabarismo,
cama elástica, perna de pau e esquetes de palhaço, que são oferecidas
pela Trupe Educação e Picadeiro. O valor varia de R$ 150 a R$ 170,
dependendo do número de dias na semana em que o aluno participa.
De acordo com o diretor administrativo
da trupe, Kaoê Gonçalves, outras duas escolas contrataram o serviço em
São Paulo, e o número de alunos matriculados atualmente é de cerca de
200.
Gonçalves explica que as aulas de circo
atraem porque oferecem uma atividade física sem os obstáculos do
formalismo das academias e da competitividade dos treinos de modalidades
esportivas. “Quando a gente vai a uma academia normal, a gente sofre só
de ouvir falar que tem que fazer dez abdominais. Mas, quando vai fazer
uma atividade no trapézio, a gente usa o mesmo músculo, só que sem
aquela coisa muito rígida, formal, do exercício pelo exercício”, afirma.
Atividade lúdica e inclusiva
As aulas diferem da educação física
porque os objetivos pedagógicos são diferentes, diz o especialista. Elas
estariam mais próximas dos treinos que os alunos costumam fazer no
contraturno das aulas regulares. Mas, no caso do circo, as atividades
não excluem os alunos de acordo com a habilidade em um determinado
esporte. “No circo é o contrário, tem espaço para todo mundo”, diz o
diretor. “O menos habilidoso vai ter dificuldade para fazer malabares,
por exemplo, mas pode ajudar a fazer figura coreográfica.”
A faixa etária em que as aulas ganham
mais popularidade são nos primeiros anos do ensino fundamental. De
acordo com Gonçalves, uma idade apropriada para ensinar os conceitos por
trás dos palhaços é no segundo ciclo do fundamental, na
pré-adolescência e início da adolescência. “Quando a criança fica muito
mais tímida, retrai um pouco no mundo dela, acha que tem alguma coisa
que a sociedade impõe e ela não se enquadra, é aí que entra o trabalho
do palhaço.”
O professor Julio Micheletti Jr, dono da
empresa de cursos de arte e cultura que oferece as aulas no Colégio
Itatiaia, afirma que começou a oferecer atividades circenses há cerca de
dois anos, aproveitando o aumento da procura de aulas de circo em
academias e em escolas especializadas. Na época, diz, era preciso bater
de porta em porta nas escolas para convencer a diretoria. “Hoje, elas
procuram a gente”, afirmou Micheletti.
Júlio disse que atende a mais de cinco
escolas e que o número de alunos que participam da aula de circo subiu
de 14 para 80 em apenas dois anos.
As aulas de circo são oferecidas na
própria escola, em um espaço com equipamento instalado pelas empresas e
profissionais especializados na área. “No começo, tentei com professores
de educação física, sem especialização, mas não deu muito certo”, diz o
professor e empresário. Pedro Levy, o “tio Pedro” dos alunos de circo,
dá aulas em três colégios de São Paulo, é formado em educação física e
especializado em artes circences, além de pesquisar arte e teatro.
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